segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Aos que só rezam


Tico Santa Cruz, vocalista do Detonautas com a máscara de V de Vingança em pleno show do Rock in Rio

Rock in Rio... hmmmm


System of a Down, Evanescence, Detonautas, Cold Play, Slipknot... São bandas que carregam na essência uma herança que faz parte do Rock na raiz. Essa herança não é simplesmente a idéia de tocar um som com baterias pesadas e guitarras virtuosas, mas sim a herança de utilizar o Rock como ferramenta de conexão entre uma visão contrária das relações homem-mundo (surgida inicialmente lá atrás quando o Cubismo nasceu contrariando as visões Surrealistas - que pelos cubistas eram tidas como aspirações “burguesas” sem compromissos com a realidade), e a expressão dessa visão através de um conjunto de caracteres que por fim seria cunhado de Rock nas suas mais variadas vertentes de posicionamentos engajados.
Não que toda banda deva ou tenha que ter intrinsecamente em sua formatação a característica questionadora ou uma postura de nítida rebeldia, até porque essa mistura entre postura revolucionária e a música advêm do movimento Punk inglês dos anos 60 e 70. Ou seja, não é algo do Rock em específico.  Mas o Rock, para ser Rock mesmo, precisa ter esse tal teor de rebeldia, que é essencial para que qualquer um possa curti-lo em sua amplitude - uma guitarra e um baixo solando juntos no palco unindo-se com a idéia primordial. Ou seja, instrumental, ideal e atitude (Alguns são mais politizados, outros mais existenciais, outros mais artísticos e expressionistas).
E dentro desse ponto de vista, é ridículo ver o Rock brasileiro ser representado no Rock in Rio por bandas como Glória e Nx Zero. Bandas essas financiadas por um produtor musical (Rick Bonadio) que só não levou a banda Fresno (também pertencente a sua trupe) para o festival, pois percebeu que seria demasiadamente forçado, e o público perderia de vez a paciência.
A banda Glória foi vaiada enquanto estava no palco. Com suas letras pseudo existenciais, que falam de paixonites baratas e frustrações amorosas o tempo todo, percebeu que não estava agradando ao público que ali a assistiam. Tentou um cover de Pantera, mas nem assim conseguiu disfarçar aquilo que todo bom conhecedor de Rock’n Roll  sabe... a sua insignificância cultural ("anti cultural" para ficar mais especifico).
O Glória no cenário do Rock atual poderia comparar-se ao Sergio Malandro no mundo da televisão. Sem conteúdo, sem base filosófica daquilo que se propõe a fazer... Se preocupam com a estética de suas roupas, com os solos de guitarra, pedais duplos, mas em sua razão de existir - que seria a idéia por trás das letras, a atitude por trás das roupas – é apenas um choro gritado de forma melódica e infantil.
O Nx Zero, que é uma banda criada pelo mesmo fundador do Glória (Yuri Nishida, que fundou a Granada e hoje está na VOWE), segue a mesma linha. Surgiu num cenário underground paulistano de playboys patrocinados por pais empresários que nunca precisaram dar uma ralada como operadores por trás de máquinas e computadores, e que chegam lá em cima do palco para afirmar em suas letras que diante de tudo o que circunda o homem contemporâneo eles “só rezam”. O Glória sobe no palco para expressar em gritos que a mina (ou garoto, sei lá) “vai pagar caro por me conhecer”.
O que o produtor dessas bandas tem na mente? Ele chegou a afirmar que todas as críticas feitas pelo Tico Santa Cruz à sistemática capital monopolizadora do rock brasileiro – referente ao VMB da MTV ser algo comprado e que as bandas financiadas por esse produtor não chegaram onde chegaram por méritos e sim pela sacada do produtor, de que as bandas que hoje falam de amor nas rádios e canais de TV agradam bem ao público novato alienado pela televisão de entretenimento que vêem o rock como forma de personalizar suas aspirações individuais, sem mensurar a mecânica por trás de cada banda que toca nas sintonias e trilhas sonoras de novelas teens – seria puro marketing do roqueiro para sobressair-se através da denúncia.
Concordo com o Tico. Pois, é positivo - culturalmente falando - você financiar uma banda por acreditar que aquilo que ela se propõe a falar e tocar tem substância e pode perpassar os interesses econômicos oferecendo senso crítico à quem a ouve, foi  uma atitude muita executada no anos 80 e 90 por alguns empresários e produtores, mas o que o produtor dessas bandas "EMOtivas" faz, nada mais é do que reflexo do otimismo neo liberal que pensa que monopolizar o espaço público e privatizar as relações é a melhor expressão de liberdade. Mentira!
Existe um cenário musical independente no Brasil muito forte, bandas consistentes, com bagagem intelectual e muitos dos que foram um dia do cenário POP hoje estão voltando para esse local undergroud; como é o caso do Charlie Brown Jr que reincidiu com a Sony, o próprio Detonautas que faz uma série de serviços sociais e vagam com a banda por cenas no Brasil inteiro, o CPM 22 que preferiu voltar com a atitude independente por não concordar com as visões “interesseiras” das gravadoras que tentam influenciar o tempo todo no conteúdo de repertório.
O Rock é anti cultura, é questionamento, serve de entretenimento sim, mas antes é uma postura perante a posição conformada da sociedade pós moderna viciada em terceirização.
Líderes de bandas inertes a verdadeira essência do Rock adoram o argumento de que é melhor falar de amor do que de guerra, falar de individualismo infantil do que pensamentos críticos, mas eles tentam forjar a própria incompetência e a própria ignorância cultural nesses dizeres sem contrapontos concisos. É só compararmos War do System of Down e Piano Pefeito do Glória.
Não tem comparação, sejamos sinceros. Ninguém aqui assiste Nickelodeon, assiste? não se toca System of a Down nesse canal infantil, só Glória, Nx Zero, Fresno, Restart e outras mais.
O produtor dessas bandas vazias de conteúdo já foi chamado muitas vezes por intelectuais como Fernando Anitelli para discutir essa visão que ele adquiriu de que "é bom quem vende disco" (isso ele já afirmou em entrevista a sites e programas de televisão). O que ele faz é fugir com o argumento de que “discutir com invejosos é perda de tempo”.
Fernando Anitelli é o líder da banda mais baixada na internet dos últimos anos, considerado um dos maiores compositores contemporâneos que utiliza a visão crítica junto a outros elementos, como teatro e poesia, para dialogar com aqueles que se propõem a fazer downloads grátis de suas músicas. Na concepção de Anitelli “o artista não pode simplesmente terceirizar aspectos que deveriam fazer parte de sua gestão como trabalhador, ou seja, gerar e gerir sua música sem ficar escravo de jabás a serem pagos ou presos em expressar aquilo que a gravadora e o produtor acha que deve ser produzido”.
Detonautas foi a única banda independente no Rock in Rio de 2011, e ainda chegou lá com muita gente nos bastidores desacreditando de seu potencial para levantar a galera. Mas pelo contrário do esperado, não só subiram no palco e cantaram com firmeza como também contagiaram com flashs politizados àqueles que de repente acharam que só o System e o Evanescence teriam algo para oferecer ao evento no último dia.
Fresno, Nx Zero, Glória, Hateen e outros  estão todos presos ao público alvo que seu produtor almeja alcançar, as crianças!!!... prêmios Nickelodeon de música... ou seja, quem mais for ouvido por crianças menores de quinze anos será a banda que aparecerá no Rock in Rio...foi o caso de Glória e Nx Zero.
Existe muita banda nacional boa, adulta, e que poderia fazer muito melhor do que esses playboys criados com a avó. Bandas que defenderiam uma bandeira realmente, que conseguiriam oferecer algo além de puro entretenimento num evento grande como o Rock in Rio. Mas por representarem uma ameaça aos donos do capital que rola na pseudo cultura POP, são abafados sem oportunidades reais de exposição de seu conteúdo...

Fernando da Silva Ribeiro (Sinnentleerten)

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