sábado, 18 de outubro de 2014

"...Elogio a Acídia..."

É interessante como dentre os 7 pecados capitais, a preguiça é o mais rechaçado e condenado pelos arautos da pró atividade mecanicista moderna. Pois o fato, é que a preguiça se constitui a mais subjetiva das disposições pecadoras, pois ao tomar conta da alma ela te anula, te isola, te descompromissa, te leva ao ceticismo e ao ócio, a aversão perante a ação propriamente dita, ou seja, não te engendra a fazer o mal a outra pessoa de maneira direta, mas sim indiretamente em relação ao fluxo da sociedade que precisa cada vez mais de executores operacionais dentro da ordem pública e privada...
A preguiça, parece ser mais uma postura do indivíduo consigo mesmo, de esvaziamento das vontades, ganâncias e compromissos do que uma maneira ativa de estar presente nos ambientes.
Diferentemente dos outros pecados que encontram relação direta com os outros seres humanos e que nos leva a encontrar de fato no instinto permissivo o hábito de caráter malévolo [como a avareza, a ira, a vaidade, a gula, a luxúria e o orgulho], a preguiça deveria ser valorizada eticamente diante das truculentas demandas do nosso dia a dia que insiste em nos implantar o compromisso com agendas sombrias do tecido social...
A preguiça enfim, se apresenta atualmente mais como uma dádiva do homem do que dívida perante as proclamações deformistas e niilistas correntes no globalismo das relações.

Fernando Ribeiro

terça-feira, 7 de outubro de 2014

Mazelas

Dentre as mudanças psicológicas no ocidente mais significativas no que data nosso advento da modernidade, é o fato de não mais nos projetarmos como os antigos (que viviam em comunidades, tribos, sociedades regidas por credos, visões míticas) de forma uníssona e repulsiva aos outros povos como se fossem os Bárbaros, os Filisteus, de Culturas Inferiores. Pois como “massa”, esses tais antigos tinham enraizados em suas sociedades preceitos e valores culturais integrados que auxiliava no suporte daquilo que entendiam como sendo a “segurança”, a “paz” e a ”harmonia”. Em sociedades agrárias locais e regionais desintegradas do restante do Globo Terrestre, vivendo sob a esfera de credos, cosmologias práticas a respeito do mundo, sob tabus morais, instabilidades e ausência de leis concretas, estavam sempre enfrentando momentos turbulentos e de guerras constantes.

O inimigo e culpado pelas "mazelas" que ocorriam eram simbolizados por representatividades da Natureza, achando por vezes serem guiados por chamamentos de outros Povos, por Entidades ditas “Demoníacas” que poderiam a qualquer instante pôr fim as estruturas afetivas e concretas de seus convívios. 

Hoje, não nos livramos desse tal instinto de rebanho, e quase sempre estamos sujeitos ao misticismo, ao relativismo conveniente e preguiçoso, e aos preconceitos de massa que ainda habitam comumente as nações orquestradas em suas culturas principalmente por conservadorismos intensivos e morais, e principalmente religiosidades presunçosas. Porém, é nítido que quando somos capazes de nos desprender por alguns instantes dessa materialidade contemporânea, através do suporte intelectual e certa “práxis teleológica”, com ênfase profunda em pensadores da moral humana, não mais olhamos aos outros povos e comunidades vizinhas como sendo o oposto daquilo que consideramos como “Equívoco” ou como “Culpados” pelas nossas “Misérias”. Pois, de certa maneira, crescidos e absorvidos pelas ranhuras de nossa história e pergaminhos de nossa ciência, temos a oportunidade de discernir que de repente aquele que simplesmente encontra-se ao nosso lado (falando a nossas língua, sob a mesma bandeira nacional) avizinhando nossos passos pode não convir, de repente aquele ser vil que habita nossas rotinas mais simplórias [sagradas ou profanas] podem não nutrir valor por reflexões profundas referente a realidade humana. E após passarmos pelo fenômeno Iluminista que sucedeu a Renascença, fomos através da história moderna e Humanista aprendendo que o “mal” não mais se encontra tão longe assim como pensávamos antigamente, mas é sim suscetível a possibilidade de dar suas caras de quando em vez ao nosso lado; e que se nos olharmos no espelho com mais afinco poderemos constatar muitas vezes tal mal habitando o nosso próprio interior, ludibriando nossas próprias convicções, visões de mundo.

Me parece que nosso primitivo instinto de segurança atualmente nos dá vazão, através de um profundo conhecimento interno, de expulsar (as vezes até de maneira racional) pessoas e situações crônicas de nossas vidas como antes nunca havíamos experimentado. O fato de hoje conseguirmos nos desapegar de lugares, situações e pessoas que nos incomodam com tanta facilidade, talvez seja uma das mais importantes dentre as muitas alterações psicológicas e sociais que sofremos ao longo do tempo e da história.


Enfim, fazendo aqui um juízo de valor, considero essa alteração de postura perante a sociedade a mais importante, pois parece abrir caminho a tantas outras percepções e ações que podem porventura nos levar a questionamentos inabitáveis ao senso comum... Mas que nos ajuda a separar o que é preconceito e o que não é nas coisas triviais de nossas relações humanas.


Fernando Ribeiro
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